Quem é o culpado pelas alterações climáticas?
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Fundamentações científicas com contaminações políticas

O Público de 24/12/2009 publicou no suplemento P2 um esclarecedor artigo de Viriato Soromenho Marques (VSM) intitulado "De Copenhaga rumo ao México a União Europeia pode fazer a diferença, no qual persiste em ignorar que Copenhaga foi, sobretudo, uma humilhação para a UE, pois a realidade virtual que criou e liderou não lhe deu sequer acesso à mesa onde o acordo, que subscreveu, foi negociado.

A UE pode fazer efectivamente a diferença se reconhecer que a mobilização pública conseguida com o alarmismo climático está esgotada e é contraproducente. Esse alarmismo, baseado num pseudoconsenso científico. levou à defesa de cortes nas emissões de CO2 impossíveis de realizar sem devastadoras consequências económicas e sociais. Efectivamente, e segundo VSM, "num impressionante estudo que procura aliar ciência dura e diplomacia, o Conselho Federal Alemão para a Mudança Global (WBGU), dirigido pelo eminente físico Hans Joachim Schellnhuber" (que se propunha ser o guião para as negociações em Copenhaga), concluía-se que, até 2015-2020, o consumo de combustíveis fósseis teria de estabilizar para vir a desaperecer dentro de 40 anos. Por este, entre outros motivos, o acordo legalmente vinculativo defendido pela UE/ONU e a maioria das ONG não poderia ser cumprido. E quem o quisesse honestamente cumprir, não o poderia assinar.
Mas será que tal acordo significou mesmo a "incapacidade da comunidade internacional (...) prevenir a primeira mudança da estrutura ecológica e ontológica do planeta causada pela acção humana" como afirma VSM? Não me parece, porque o pilar fundamental deste tipo de argumentação é uma grosseira adulteração das implicações do conhecimento científico fundamental e básico(*).

Alterações climáticas e aquecimento global foram vulgarizados como sinónimos, e o passo seguinte foi atribuir erradamente o aquecimento global (quase exclusivamente) às emissões de CO2eq. Invoca-se, para isso, um difuso consenso científico, no qual nunca fica claro a que fenómenos ou leis físicas se refere. Existe, efectivamente, e há décadas, indiscutível consenso científico quanto ao facto de o Co2 ter efeito de estufa e de o vapor de água ter um efeito de estufa muito maior. Mas tal consenso não existe quanto à relação quantitativa entre o aumento da concentração de CO2eq na atmosfera e a elevação da temperatura média global do ar junto à superfície (ETMGAJS)(**). Segundo o próprio relatório científico do IPCC, considerado como referência fundamental (ARA4WG1, p114), a ETMGAJS devida a uma duplicação da concentração em CO2 na atmosfera tanto poderia ser de 1,9ºC com de 5,9ºC (dependendo do modo como se considera o efeito das nuvens). A ETMGAJS depende da chamada sensibilidade climática e em relação a ela o IPCC afirma (ARA4WG1, p640) que: "A set of model metrics that might be used to narrow the range of plausible climate change feedbacks and climate sensivity has yet to be developed".
Ou seja, o próprio IPCC reconhece que não se sabe qual o valor a escolher, mas os proponentes de cortes radicais, como os referidos, actuam como se soubessem. A verdade é que, por exemplo, o IPCC nunca recomendou um aumento de temperatura a não exceder, tal como nunca recomendou um limite de emissões para o conseguir. Tais valores são decisões políticas (não científicas!) e a argumentação da UE tem por base uma batota com as leis da Física. Uma batota que consiste em apresentar (como consequência de leis físicas inequivocamente consensuais) uma relação quantificada entre emissões de CO2eq e aumento de temperatura média, que só pode ser obtida com grosseiras simplificações e factores numéricos politicamente escolhidos(*)!

Embora haja fenómenos climáticos que se podem associar ao aquecimento, atribuir tudo ao aumento de concentração de CO2eq na atmosfera é um absurdo. É muito mais honesto reconhecer que se não conhecem todas as causas do que inventar cenários catastróficos que só levam ao descrédito.

Se a UE quer liderar, tem de dar o exemplo de uma fundamentação científica das suas propostas sem contaminações políticas (que deram o climagate), e de medidas exigentes, exequíveis e verificáveis. Se está de facto preocupado com as alterações climáticas de origem humana (e deve estar) não precisa de invocar os resultados pouco fiáveis dos modelos climáticos actuais para actuar em profundidade na reforma do seu sistema energético, porque tal reforma é exigida pela competitividade económica e pela sua dependência de fontes de energia insustentáveis e agressoras do ambiente. Se está de facto preocupada, deve acabar com a hipocrisia do mercado do carbono e da contabilidade de Quioto e substituí-la pelos instrumentos regulatórios e fiscais de que tem grande experiência.
Grande parte da lista do que pode e deve fazer já foi enunciado a pretexto de aquecimento global. Manter o que se justifica por si próprio, sem ter de recorrer à ameaça de catástrofes climáticas, é o passo que a UE tem que dar para recuperar a credibilidade perdida e uma liderança real.

(*) http://jddomingos.ist.utl.pt

(**)"aquecimento global","aquecimento","elevação da temperatura média" ou "aumento da temperatura" referem-se sempre à Elevação da Temperatura Média Global do Ar Junto à Superfície (ETMGAJS).
Fonte: José J. Delgado Domingos (Professor catedrático do IST (jjdd@ist.utl.pt)), público, fevereiro 2010

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